quarta-feira, 25 de maio de 2016

hoje eu entendi uma meia dúzia de coisas, mas como elas se processam lá no fundo do meu mundo eu ainda não vou dizer nada pra ninguém porque a minha intimidade compartilhada é bem menor do que parece ser. inclusive não estive útil às três da tarde mas eu segui adiante que nem só de utilidades altas e propósitos das mais altas naturezas vive a vida. 

*

trazer dicionário de símbolos 
martelo 
estante 

(a respeito da conversa que tínhamos mais cedo)

como dizer que do desejo já entendi o reverso, e do reverso encontrei o avesso travado em laços despeitos formas de gelo mas eu só engasgo por cansaço. 

demolir uma pessoa 
o quanto a pessoa 
demolida a pessoa 
 

segunda-feira, 9 de maio de 2016

repente

madrugada total provável recurso do desgaste foi alavancar uma concentração radical na ansiedade do necessário a ser a ser a ser a ser feito. feito fazendo um ser. mais tarde, cortando tabaco com uma tesoura acordei pela repetição fazer a tudo que se repete como um gesto sagrado, não ser uma pessoa moderna monótona esperando das revoluções algum traço a mais do que um círculo quando muito nítido num telescópio bem limpado. veja não estou fazendo concessões a vida só poderia ser total. sei q cada um dos gestos q a minha ansiedade imaginou eu tirei o dia pra cumprir. espero a calmaria como quem liberta os ombros, mas não agora ainda. é tempo de começo. Oxaguiã. a ponta de um círculo só existe se o quebra ou quando é vista num golpe de sorte por quem estiver no meio.

quarta-feira, 4 de maio de 2016

sou uma poeta sem inéditos e assim eu me sinto como uma poça sem água. conheço meia dúzia de mandingas, noite dessas sonhei que o chão virava água, mas não sei, novamente, como é escrever e é por isso que eu tenho escrito qualquer coisa por aqui. que é pra manter a máquina rodando. uma vez li uma entrevista com o Gonçalo M. Tavares em que ele dizia que antes de começar a escrever, ele escreve durante 3 horas seguidas. "pra ligar a máquina". escrever é antes/durante/depois de tudo um gesto.

em Lisboa tive a sorte de ter aulas de escrita de romance com o Gonçalo M. Tavares, que é tão inteligente que conseguia ensinar os alunos a pensar, a ver, a observarem a diferença entre ver e olhar e observar, mas não a escrever. as apresentações de trabalhos de curso de escrita de romance de GMT eram orais.

não cheguei a apresentar nenhum trabalho, as aulas sobre Hamlet me consumiam toda a energia e chegaria a dizer que aproveitei algumas deixas interiores pra desistir de tudo algumas vezes naquele ano. seis meses antes eu tinha terminado o mestrado e um livro inteiro, os dois ao mesmo tempo. nunca vou ter coragem de reler minha dissertação e meu livro ao mesmo tempo, mas eu sei que há uma ponte, um vale, um rio entre eles, que os une. talvez eles sejam a mesma coisa.

e eu fico tão obcecada num só objeto, daí o objeto fica pronto, eu morro. e é sempre uma morte lentíssima a ressurreição. então eu só escrevo não é nem pra passar o tempo. é porque quando escrevo não tenho a mínima ideia do que estou fazendo. e é isso, o que eu amo.

terça-feira, 3 de maio de 2016

sempre que muita coisa acontece na minha vida alguma realidade desloca a retina e eu começo a ver nas pessoas da rua gente que não existe mais na minha vida e eu acelero vou pra cima só conheço o êxtase o pleno agudo não sou uma pessoa de nuances embora esteja na sintonia. dez anos atrás eu procurava meu reflexo nas vitrines porque o eu precisava saber quem o eu era, eu conhecia muito pouco a minha imagem. é isso Narciso sabe-se muito pouco nele mesmo, então quando se vê se desconhece e se fascina o desconhecido se afoga. todas as profecias que sigo pregam o autoconhecimento, o eterno descascar da cebola. eu fiz psicanálise anos até que apareceu a ayahuasca que olhou pra cebola e disse assim "cebola? que cebola? agora vai ser manjericão! hortelã! rizoma! e esse pedaço aqui não adianta explicar que está meio podre por isso ou aquilo, esse pedaço está podre! e o podre? vai pro lixo".

é uma compreensão mais material a que alguns dos psicotrópicos trazem pras consciências. sei que eu ando vivendo tanta coisa que na hora de ver ando preferindo assistir netflix do que ter visões, sobretudo com pessoas que já não sei quem são no meio da rua. vi nos ombros envelhecidos de algum velho os ombros envelhecidos que ele teria hoje, a corcunda. agora imagine dizer pra alguém: lembrei de ti na corcunda de um velho. viver pode ser tão velho.

e sempre que minha vida muda uma burocracia vem junto porque sou da ordem dos materiais, dos que usam papel, daqueles que constróem/são as naus de si mesmos. toda uma papelada pra se ser quem se é e pernas pra que te quero.

só hoje eu andei uns 14 quilômetros sem nem perceber. sempre que mudo me torno a andarilha que eu sou do fogo alado nos pés como os exus, mercúrios, transpondo, trazendo e voltando. nasci pra intérprete e não sei falar nenhuma língua. quando a vida muda já não me procuro mais nos reflexos, mas ainda preciso sentir o chão embaixo dos meus pés. o chao do sal da terra o chão. então eu não sossego, eu quero é mais. é que morrer deve ser muito chato.
um mundo em que alguém diz pra outro alguém
"a paixão que eu tive por você, lembra? meu psicanalista entendia que ela era uma crise narcísica"
é um mundo que precisa de um longo carinho no umbigo
 

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